domingo, 24 de fevereiro de 2008

O velho das pintas dormiu

Um velho observa a rua pela sacada de sua casa de três andares.
Sempre no mesmo horário, ele se senta e olha o movimento dos carros e das pessoas moradoras daquele bairro que não é nem agitado, nem muito calmo.
Tem um mecânico consertando um automóvel no mesmo lado da rua onde passo, todos os dias. Primeiro pela manhã, ouvindo alguma música relaxante e logo em seguida, pela tarde, agitada caminho com pressa para um banho demorado, rock talvez, talvez Hiphop.
Esse cara de cansado, sentado na cadeira solitária, não leva a expressão de trabalho braçal. Tem o semblante de quem trabalhou muito durante a vida, como advogado talvez. Alguém que precisou ser sério e bom pai. Será que ele já é avô?
Ontem, passei com a mesma rapidez de sempre, quem sabe um pouco mais! E vi o velho me olhando. Trocamos tão rápido olhar, que não deu tempo de perceber mais nada, mudei o olho como sempre faço, de maneira rápida, como meus passos. E quando pensei que o velho estava me olhando, olhei de novo e ele já estava adormecido.
Rápidos segundos para tudo isso. Como rápido falo e ando, e como e até transo.
Engulo rápido como mudo de estação de rádio, no meu MP5.
O velho parece calmo. Aquela cabeça branca, com as sobrancelhas ralas. Ele é muito branco, muito mais branco do que eu. E tem pintas pelo rosto inteiro, e nos braços. Penso que deva ter pintas pelas costas como sardas feitas pelo sol e pela velhice, e não daquelas dos ruivos.
Quando observo o chão da rua, dessa mesma rua, ao andar, pela manhã mais vazia. A rua é feita de pedras, e imagino que a rua tem pintas de pedras. Algumas mais claras outras mais escuras. As pintas colorem a rua, e na chuva fica bem mais divertida do que o asfalto preto.
Se o velho estivesse de olhos abertos, teria me visto olhar novamente para ele, segundos depois. E talvez, nossas mentes se interligassem e ele de sua maneira calma, ou não, pudesse captar esse pensamento doido das pedras. E então, imaginaria que suas pintas do braço são como as pedras da rua sem asfalto. E que seu corpo na chuva, poderia ser mais divertido do que o corpo de alguém sem pintas.
Às vezes me pego observando as pessoas pelas ruas, como ele faz. Mas sem dormir! E sei o quanto sou parecida com elas, e sei o quanto não quero ser parecida com outras. Será que o velho cansado, já fez isso também?
Hoje pela manhã, choveu bastante. E ao ir para o trabalho, encontrei o velho na rua, tive a certeza que trocamos olhares, pois o velho sorriu para mim e estava completamente nu.

8 comentários:

Anônimo disse...

sobre o texto complicado sobre a autora te amoooooooooooo
primaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
saudadesssssssssssssssss
bjssssssssssssssssssssss

Claudio Nascimento disse...

GENIAL,

ISSO É POESIA!!!

Parabéns, o tom poético cria um clima diferente que gera inclusive diversas interpretações.

Ao meu ver, quando vc fala sobre o velho nu, é como se houvesse toda a transparência no olhar dele... e esse transparência te permiti enxergar mais do que se poderia na correria do dia a dia.

Bjs

Mariana Montenegro disse...

ontenegro.m5Olá! Saudade docê. Por onde andas?

Carol Bonando disse...

q bom, há pessoas que gostam do mes texto e entendem o que significam... cada um de seu modo, mas entendem... nada de complexidades com masturbações filosóficas .... só um velhinho e ponto final!
bjocasssssss

Unknown disse...

simplesmente maravilhoso, sim o velho nu.......td transparece, como deveria ser a nossa vida...rs bjs te amo!

Claudia Sousa Dias disse...

Olá Carol.

Você também já não posta nem aparece há uns lagos meses...

Só não é, de forma alguma concordar com a sua opinião sobre o livro de Pazzi. Primeiro por causa da qualidade da escrita que é realmente superior. Segundo, o final não é tão óbvio assim porque há de facto uma variante em relação à versão oficial e também por todo o simbolismo da obra, quem está perfeitamente dentro do imaginário colectivo russo e também com a personalidade do Autor, apesar de italiano.

bj

CSD

Dri disse...

...esse velhinho me lembrou um outro, tão cheio de pintas...
quem sente, sabe
e me fez delirar, em busca de um outro nem tão velho assim, mas que também está ficando cheios de pintas... e caras... e trejeitos... quem será??? rs...
muito bom, adorei o texto!!

Carol Bonando disse...

a nudez final pode ser a morte. Uma deixa...