Descendo as escadas da tia Maria, na casa onde morei até os meus 8 anos, tive a nítida sensação de que as lembranças vieram viver mais do que minha presença.
Encostei o braço direito na parede, após perceber os mofos contínuos naquela parede que hoje é uma sala, e que antes era o quarto da minha família toda. Dormíamos, mãe, pai, irmã e eu no quarto com a parede mofada, deixando nosso guarda-roupas há uns 70 centímetros de distância do local incômodo.
Crianças irmã, amigas e eu, brincávamos de esconde-esconde no escuro, e eu sempre percorria o quarto todo com muito medo de topar o dedinho do pé ou a canela em algum móvel, depois entrava atrás do guarda-roupas e encostava o braço direito na parede mofada, e ia me arrastando até chegar num ponto, onde ficava o espelho na parte superior e embaixo dele havia um espaço para colocarmos um banquinho. Quando o pegador vinha pelo mesmo caminho, eu abaixava a cabeça e corria pro meio do quarto, por baixo do espelho. Hoje, descobri que aquele espaço aberto é exatamente onde fica o final do sofá da minha tia, por onde tenho que passar pra sair da sala e chegar até a saída da casa.
Desci as escadas com medo de cair, porque são irregulares os degraus, e encostei o braço direito me deixando levar pela lei da física e pelas memórias. Não estava mais ali com 26 anos. Naquele momento eu tinha aproximadamente 7 anos, com franja, cabelo despenteado, shorts, camiseta curta de manguinha e chinelos nos pés. Nada do que eu sou hoje tinha importância naquele instante. Sentia meu braço curto e os dedos finos ralando na parede de forma leve e muito mais sutil do que poderia ser hoje com o meu peso e o meu tamanho.
A memória viveu. O presente foi levado a uma linha secundária e esquecida. O cheiro do quarto penetrou nas minhas narinas e tudo isso só sumiu quando atravessei o espelho, abaixada, e sai na sala da minha tia Maria.
A descrição da cena não pode ser tão perfeita quanto a sensação que tive naquele instante e por mais que eu tivesse tentado contar aos familiares que estavam ali na festa do dia 24 para o dia 25, nenhuma palavra e nada que eu fizesse convenceria alguém de que não estive ali por segundos, mesmo porque as pessoas presentes me viram descer as escadas, fazer a curva do sofá e passar por toda a sala até sair da casa.
Foi um feliz natal este ano e espero que tenha sido para você também.
3 comentários:
belo conto de natal
Beijos!!!
Magnífico texto.
Gosto imenso da sua narrativa.
Carol, querida amiga, espero que o teu Natal tenha sido muito feliz. Desejo-te um excelente 2011.
Beijos.
Eu amei q estivesse conosco. te amo mto e entendi todo o percurso. bjuuuu
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